domingo, 1 de junho de 2025

Comparando Os Sertões e A Mãe: Uma leitura marxista sobre as lutas populares no Brasil e na Rússia

 introdução

A literatura tem o poder de revelar as tensões sociais e as contradições históricas que moldam as sociedades. Ao compararmos Os Sertões, de Euclides da Cunha, e A Mãe (Матерь), de Máximo Gorki, a partir de uma perspectiva marxista, podemos entender as diferentes representações das lutas populares e os contextos históricos que os moldaram — Brasil rural pós-abolição e Rússia pré-revolucionária.


1. Contexto histórico e social

Aspecto Os Sertões (Euclides da Cunha) A Mãe (Máximo Gorki)
Período Final do século XIX / início do XX, Brasil pós-abolição e República jovem Início do século XX, Rússia pré-revolucionária, antes da Revolução de 1917
Contexto social Guerra de Canudos: conflito entre o Estado republicano e um povoado sertanejo marginalizado Movimento operário na Rússia, repressão czarista, despertar da consciência de classe
Classe social Sertanejos pobres, pequenos agricultores, camponeses expulsos e marginalizados Operários, trabalhadores urbanos, classe proletária emergente
Tema central Conflito entre centro (Estado) e periferia (sertão), exclusão social e resistência popular Conscientização política, organização e resistência da classe trabalhadora

2. Representação do povo

Os Sertões

  • O sertanejo é retratado como um “homem forte”, moldado pela aridez e abandono.

  • Apesar de carregar traços do preconceito científico da época, o texto valoriza a resistência e a dignidade desse povo.

  • A comunidade de Canudos representa uma forma tradicional e comunitária de vida, rejeitada pelo projeto moderno e burguês.

A Mãe

  • A protagonista Pelageia simboliza a mulher operária que se politiza ao acompanhar a luta de seu filho pela emancipação da classe trabalhadora.

  • Os operários são sujeitos ativos da história, organizados e conscientes da necessidade da revolução.

  • O romance enfatiza a consciência de classe e o compromisso com a transformação social.


3. Temas centrais

Tema Os Sertões A Mãe
Resistência Defesa da comunidade de Canudos contra o Estado repressivo Luta da classe trabalhadora contra a opressão do regime czarista
Alienação Sertanejo alienado pela marginalização e pela violência estatal Trabalhadores alienados pelo sistema capitalista e político
Violência Massacre do povo sertanejo pelo exército republicano Repressão policial e perseguição política aos revolucionários
Natureza social do conflito Conflito entre modernização excludente e formas tradicionais de vida Conflito entre burguesia e proletariado, exploração e emancipação

4. Função ideológica e política

Os Sertões

  • Denuncia indireta da violência do Estado brasileiro e da exclusão social.

  • Retrato ambíguo: valoriza o sertanejo, mas não propõe explicitamente sua emancipação política.

  • Serve como crítica à falsa civilização republicana e ao projeto nacional excludente.

A Mãe

  • Obra engajada com o marxismo e o socialismo revolucionário.

  • Incentiva a organização e luta consciente da classe operária.

  • Propõe a transformação social como necessidade histórica.


5. Trechos ilustrativos

Os Sertões

“Canudos não se rendeu. Expugnado palmo a palmo, caiu no dia 5 de outubro de 1897, sob os escombros da cidadela em ruínas. Morriam todos — mortos, feridos e cativos.”

Esse trecho mostra a brutalidade do Estado contra um povo que ousou desafiar a ordem oficial.


A Mãe

“Não podemos esperar que os outros nos libertem. Temos que lutar com nossas próprias mãos, nos organizar e conquistar a liberdade!”

Aqui está expressa a necessidade da ação consciente e autônoma da classe trabalhadora para sua emancipação.


6. Síntese da comparação

Aspecto Os Sertões A Mãe
Representação do povo Passivo-resistente, vítima da violência estatal Sujeito ativo, revolucionário
Papel da violência Violência repressiva estatal contra o povo excluído Violência de classe, necessária para a revolução
Projeto político Crítica à exclusão social, sem proposta revolucionária clara Proposta explícita de emancipação social e luta de classes
Contexto Brasil rural, fronteira entre modernidade e atraso Rússia urbana, luta proletária e socialismo emergente

Considerações finais

Os Sertões e A Mãe são obras que revelam a luta de classes em seus diferentes contextos históricos e sociais, mas com focos e propostas distintas. Enquanto Euclides da Cunha denuncia a exclusão violenta do sertanejo pela República brasileira, Máximo Gorki assume um compromisso claro com a revolução proletária e a transformação social.

Ambas são essenciais para compreender o papel da literatura como ferramenta de denúncia e reflexão sobre as injustiças sociais, além de oferecerem olhares fundamentais sobre a história cultural e política de Brasil e Rússia.

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